sábado, 28 de julho de 2007

A ressaca não estava fraca e a memória nada boa.

sábado, 21 de julho de 2007

Drama XX - (por ele)

Ele jogou o cigarro na calçada.
Olhou a praia, sentiu o vento, observou o quão deserto aquilo poderia ser e era.
Procurou.
Procurou como quem nao procura nada e com a urgência de querer achar como nunca.
Procurou-a.

E como a acharia?
Dez anos haviam se passado.
Deveria contar, se sua matemática falida nao o enganasse e se a ficha que possuia dela fosse verdadeira, trinta e dois anos. Como reconhecer um rosto de vinte e dois em uma mulher de trinta e poucos? Como achar sua menina, se procurava uma mulher?

Desabotou três botões de sua camisa branca, dobrou as mangas, descalçou os sapatos e começou a andar na areia.
Seu rosto continuava sereno e bonito mas, seu sorriso que antes desfilava por onde ia, surgia, agora, apenas quando o carregava de sarcasmo e ironia.
Poucos motivos pra sorrir em um continente como a Europa. Muito trabalho, pouca alegria e nenhum romance parisiense ou uma paixão espanhola arrebatadora.
Belas mulheres que comandava, mas nao se envolvia.
Belas festas que dava mas nao participava.
Envelhecera.

Uma cena distante passeiou pelos seus olhos:

- Muito trabalho ou ausência de amor, seu velho? - perguntou Helena, escalando sua cama em direção a ele, que estava perdido em pensamentos e não havia notado quando entrara no quarto.

- Sua grega hostil - sorriu com sarcasmo, enquanto segurava seu cabelo - já chega me xingando.
- Meu amor - disse ela, enquanto abria sua camisa - nao gosto de vê-lo vestido na cama.
- Tentando me seduzir, Helena? - falou, enquanto descia a alça do vestido preto elegante, que ela usava.
- Gostou do meu vestido? Comprei pra vc...
- ...tirar?
- Tudo. Desde que você nao fuja de mim, como há pouco tempo.
- An? - nao a acompanhava mais. Estava ocupado, contornando seu decote com os dedos.
- Você. Foge o tempo todo em pensamento. Me sinto só. - fez beicinho.
- Eu 'to aqui, agora, sua grega reclamona. - Calou sua amante.


Tirou a camisa, enquanto olhava o mar.
"Lugar bonito" - pensou, observando um dos poucos lugares do seu estado que parecia desabitado.
"Por isso que é bonito", concluiu com sua filosofia de vida chinfrim.
Pensar em Helena parecia macular aquele lugar.

Lembrou-se do que o havia feito chegar ali.
Lembrou-se dela.
Paz.

Há oito anos Tony fixara residência na Itália. Há dez anos não pisava no Brasil.
Há seis dias havia recebido o telefonema de Tomé, informando que a tinha encontrado.
Há seis dias sofria com o desejo de reecontrá-la.
Seis dias?
Porque nao reconhecer que aquele desejo obsessivo já contava dez anos?

- Achei - dissera Tomé. - Deu trabalho, Tony. Desde que abandonou a faculdade, poucos sabiam sobre ela.
- Vc...conseguiu? - perguntou, temendo a resposta. Achar aquela mulher poderia significar tudo e nada.
- Sim. Ela casou, Tony. Logo depois que largou o trabalho com você e a faculdade. Parece que ela e o marido possuem uma vida bastante pacata. Nao achei registros de viagens nesse tempo e nada que denunciasse que existem.
- Casada?
- Sim. Mas nao têm filhos. Quer saber onde ela 'tá?


A resposta foi demorada. Tomé esperou alguns minutos antes que decidisse consigo mesmo, embora já soubesse que nao conseguiria mais fugir daquilo.
A resposta tava ali: um homem, sem sapatos, longe do local onde ele morava e trabalhava, pés na areia, em busca da casa 3057 de uma praia quase deserta.
A resposta tava em sua loucura.
Em sua obsessão.
Algo que o fez parar de sorrir, de se interessar por outras mulheres, de se empolgar com suas conquistas.
A resposta residia na casa 3057. E uma resposta absurda. Como poderia existir uma casa de número 3057 em uma praia que contava com, nao mais, que 100 casas espalhadas, escondidas, como se nao existissem?

A casa 3057 ficava mais próxima a cada passo que dava. Vento, areia, mar. Tudo fora do lugar, tudo distante do papel que escolhera viver. Tudo incomum.

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Drama I

Tirara as unhas de porcelana, analisando sua imagem.
Loira, pele bronzeada, corpo escultural e um sorriso perfeito que raramente aparecia.

Prendeu o cabelo com uma fivela, deixando alguns fios soltos caídos nas costas. Entrou no banheiro.

O dia tinha sido longo. Duas aulas estressantes pela manhã, um comparecimento ao grupo de estudos de psicanálise, que ela mesmo criara, e depois, trabalho.

O nome do cliente era Jorge, 37 anos. De início era o que sabia. A agência ligava e informava-lhe onde se encontrariam e o perfil do cliente que teria pela frente.
Perfil?
Informavam-lhe um nome, que poderia nao ser verdadeiro e uma idade que geralmente era falsa. Diziam-na alguns fetiches do cliente e local de encontro escolhido. Alguns, preferiam tomar um drinque antes de irem pro motel. Os solteiros, divorciados, mais tímidos, nervosos ou marinheiros de primeira viagem. Alguns, cativos, já tinham um local certo e raramente o inovavam. Geralmente, encontravam-se lá. Algumas vezes chegava antes do cliente e ficava estudando na cama. Nao foram raras as vezes em que estudou no motel, nos intervalos dos encontros. Principalmente em época de provas.

Ligou a ducha quente, deixou cair a toalha e entrou no chuveiro, relembrando seu dia:

- Oi, Antônio.
- Melina? Desligou o celular? - questionou seu agenciador.
- Sim, Tony. 'Tava na aula, vc sabe as regras: nada de...
- "...ligações pela manhã e nem em dias de domingo", sei sim. Mas nao queria falar de trabalho. Tem tempo hoje pro almoço?
- Nao. Quer dizer, na verdade, até tenho. Mas 'to indo almoçar agora. Já são 13:20, larguei tarde da faculdade hoje. To indo direto pro restaurante e vou comer correndo. Marquei grupo de estudo às 14h.
- 40 minutos pra mim, entao?
- Sim, nada mais.
- Tá ótimo, se é só o que tenho, vou procurar me virar com ele. Pra onde vc vai?
- Pra nova pizzaria, sabe onde é?
- Perto do Centro, sei sim. Daqui há 5 minutos to chegando.
- Ahahaha! 5 minutos? Se vc conseguir, te vejo por lá.
- Verás, garota.

Mal estaciora o seu carro, alguém bateu no vidro:

- Atrasada.

Era Antônio. Aliás, era o sorriso de Antônio que parecia até chegar antes dele. Lindo, enorme.
De calça preta, blusa cor de vinho, gravata preta, sem paletó, parecia saído da passarela de qualquer melhor estilista da europa.
Como alguém como ele chegara a trabalhar no que trabalhava?

- Que mágica vc fez? Já sabia que eu bato ponto por aqui e ficou me esperando?
- Linda, eu sempre sei onde vc bate ponto, esqueceu? - falou, sorrindo
- Seus 40 minutos estão se esgotando, senhor. É melhor que me diga logo o que quer de mim. - estreitou os olhos, fingindo seduzi-lo.
- Nao faz isso que eu desmarco teu cliente das 17 horas e tiro seu dia de lucro. Vai ter que ficar comigo, de graça.
- Um dia, quem sabe. Vamos entrando?
- O que vc quiser - fez sinal, mandando-a seguir na frente.

Ele a analisava enquanto ela andava. A roupa era sóbria. Calça preta, justa, blusa de botao, sem decotes, cabelo preso displicentemente. Que homem a imaginaria como uma das garotas mais concorridas de sua agência? Cheia de livros no carro, aulas e grupo de estudos, aluna aplicada, maiores notas da sala, inteligente e linda. Nem os óculos de grau, de armação simples, deixavam-na menos exuberante. Como alguém como ela chegara a trabalhar no que trabalhava?

- O que vamos pedir? - perguntou ele, quando estavam acomodados.
- Pra mim, o "de sempre", o garçom já conhece. O que vc vai querer?
- O que você quiser me dá.
- Nao sou eu que dou aqui, é o garçom. Vai repetir esse pedido pra ele?- falou, rindo. Adorava o jeito que ele brincava, provocando-a.
- Se ele tiver o seu corpinho, pode ter certeza.
- Ahahahaha! Te odeio.
- An??? Sou seu chefe, garota. Tá no juízo perfeito? Dizendo isso pro seu chefe?
- Vc só manda em mim até onde eu permitir.
- Isso nao soa atraente. Na tua ficha, se nao me engano, tem algo como "sem limites".
- Nao quero falar sobre isso, ok? - disse, séria.
- Mas é sobre isso que quero falar, Melina.
- Trabalho? Eu 'to na minha hora de almoço, Antonio. Se eu soubesse que era sobre isso que vc iria falar, nao o deixaria vir. Vc me prometeu que nao falaria sobre trabalho.
- Espera eu fumar um cigarro?
- Já se passaram 12 minutos.

Tony acendeu o cigarro. Olhou pro lado e certificou-se que estava no lugar reservado pra fumantes. Nao tinha muita noçao do tempo, estado e local, quando se encontrava com aquela mulher. Dois anos e alguns meses na empresa, já. Ele que a admitira. Suas fotos, chegaram até ele, através de seus informante da faculdade em que ela estudava. Marcou a entrevista e nao compreendeu. Era contrastante a personalidade dela com as suas caras e bocas, enquanto desfilava pra ele de lingerie. Linda, mas completamente fora daquele papel. Há dois anos pensava sobre o porquê daquela garota. Chegara a hora de saber?

Tragou fundo. Deixou que a fumaça invadisse seus pulmões e imaginou-a preenchendo todo o seu corpo. Soltou-a, lentamente, enquanto a olhava.
Daqui há pouco, seus minutos acabariam.

- Vou expandir os negócios. Abrir outra agência, aliás, outras agências em três países da Europa. Fecharei a do Brasil, nao quero mais ficar por aqui.
- Ninguém me disse nada - falou, espantada.
- Lógico que nao. Eu que tinha que dizer. Entao, 'to levando algumas garotas pra lá. As melhores. Quero saber se você quer ir.

Sem chão. Pediu pra responder depois. Achou que aquele homem, atraente, pediria pra cancelar o cliente das 17h e viver um romance com ele. Mas o que ele fez foi colocá-la diante de seu pior pesadelo: sem emprego, como pagaria a faculdade? Na europa, como faria facudade?

Depois do almoço, estudou com pouco afinco e entregou-se passivamente ao cliente das 17h. Deixou-se beijar, fez sexo carente e como que, saudosa, daquela vida que levava. Nao era a ideal, nem era boa, alguns consideravam indigna, mas era a que tinha. E a estava perdendo... Transou com saudade da vida que nao amava, mas que a fazia sobreviver.

Aumentou a temperatura da água, soltou os cabelos e entregou-se ao chuveiro. Sempre tinha uma palavra de consolo pros outros, era o que estudava e era boa em seus estudos. Mas nao tinha quem a consolasse, pedisse pra mudar sua cara triste ou transformasse suas lágrimas em sorrisos...
E pensando em sorrisos, pensou em Tony. Sua paixão daquela tarde e pesadelo daquela noite.
Amanhã, de 13h ficaram de encontrar-se no mesmo local e ela lhe daria a resposta.
Nao vê-lo novamente... surpreendentemente aquilo a incomodava...

Ensaboou bem o corpo, saiu do chuveiro, analisou as marcas da paixao deixadas pelo último cliente, vestiu uma camisão pouco atraente e foi dormir.

quinta-feira, 12 de julho de 2007

Esperando o ônibus

Uma hora e quinze minutos. Marcara no relógio.
Há uma hora, quinze minutos e alguns segundos que pareciam uma eternidade, esperava o maldito ônibus. Já nao tinha mais palavras de maldição pro motorista incompetente. E nem dorflex na bolsa, pra alivar a dor de cabeça latejante que todo aquele tempo de sol cortante na cabeça, havia ocasionado. Desmaiaria, era questão de tempo.
Um vontade louca de sair correndo pra casa. Se nao fosse tao longe, já o teria feito. Quanto tempo de sol na cabeça, é necessário pra que alguém fique louco?
Uma hora e dezesseis minutos sairia correndo.

Prendeu apertado o cabelo castanho, num rabo de cavalo e deixou os olhos verdes se perderem no horizonte.
Vislumbrou-o. Uma cena surreal: lentamente, vindo, revestido de uma fumaça que tornava sua imagem pouco nítida. Uma miragem.

Sorriu.

O ônibus nao estava lotado e surpreendenteente, nao sentiu vntade de xingar o motorita e amarrar a cara pro cobrador. Nao estava lotado, mas totalmente preenchido. Com exceção de um lugar, no fundo. Entre uma senhora obesa, de cara amarrada e um projeto de adolescente com fone de ouvido.

Sentou.

Ultima fileira do ônibus. O que a separava da janela, onde estava sentado um garoto que parecia ser da sua idade, perdido em pensamentos e imune a qualquer presença, era a senhora obesa.
E q senhora! Remexia o tempo todo no banco, resmungava algo ininteligível, suava cada vez mais.
Resolveu perder-se em pensamentos pra esquecer a presente cena que vivenciava.

Lembrou da última conversa com Marcelo:

- Vc já acordou?
- Agora sim, bobo. Vc me acordou.
- Mari, eu tava pensando...
- E isso são horas de pensar! - começou a dizer, beijando-o no peito e subindo pro pecoço.
- Nao, nao Mari - fez ele, afastando-a.
- An?
- Eu tava pensando sobre a gente. Dá pra coversar comigo? Vc parece que só pensa em sexo. Toda vez que eu digo que quero conversar sério sobre a gente, vc me seduz e evita o assunto!
- Eu te seduzo? Vc tá louco? Eu fui a única que transei noite passada? E sempre? - cobriu o corpo. Nao havia mais espaço pra intimidade diante daquela conversa. Apertou forte o lençol contra o corpo. Onde estavam suas roupas?
- Vc entendeu o que eu quis dizer...mas vai fingir que nao entendeu, como sempre! É isso que me cansa!
- Nao seja por isso - levantou.
- O que vc vai fazer?
- Vou embora, quero deixá-lo descansar.
- Nao foi isso que eu quis dizer. 'Pera aí...
- Já deu hoje, Celo. Se eu continuar aqui vai ser pior.
- Vamos conversar, Mari. Nao quero que vc saia assim, aqui de casa. Deixa que eu te levo.
- Não to afim de conversar, entendeu? - gritou, enquanto vestia a blusa. - Depois a gente se fala.

E ainda esperara uma hora e quinze, pelo ônibus. Não era de se estranhar que sua cabeça estivesse um inferno, há pouco tempo atrás. Chorara, enquanto andava pra parada.
Mas, estranhamente, alguma coisa, entre o tempo que esperou pelo ônibus e o tempo em que esse surgiu,
mudou dentro dela.

Aquela sensação de leveza e vontade de compartilhar algo com alguém que lhe parecia bom.

Apertou o rabo de cavalo mais forte, alisou os cabelos com a mão, pediu licença pra mulher obesa e catucou o menino que olhava sonhadoramente pela janela.

-Com licença, sabe me dizer porque esse ônibus demorou tanto? Quebrou ou coisa assim?

O menino começou a explicar, parecia tímido e surpreso, mas seu olhar pacífico era tudo o que precisava naquele momento.

Escutou um "HUNF" e a mulher gorda se remexeu incomodada na cadeira.

Olhou pro menino da janela. Ele já começara a sorrir. Ela sorriu de volta.

A mulher obesa trocou de lugar com ela.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

O alemão

Há dois meses saíra da casa em que vivia com o ex namorado, pedira as contas no emprego que não assinava sua carteira e decidira voltar pra casa da mãe.
Zerar e recomeçar. Um novo tempo melhor, que fosse.

Quão grande nao foi sua surpresa quando tocou a compainha e , em vez de sua irmã caçula recebê-la, como era de costume, um loiro nórdico de quase 2 metros de altura, abriu a porta.
Pronunciou algo ininteligivél, enquanto ela o olhava paralisada, sem saber que tipo de atitude tomar.

Foi quando ouviu uma voz conhecida:

-Karl? Quem é?

Karl que, pelo visto, entendia português mas na sabia falá-lo bem, pronunciou algo que pareceu fazer sentido pra sua mãe.

-Luísa, que faz aqui?
-Mãe, quem é esse???
-Entra, entra.

E assim ficou conhecendo a história de Karl. O motivo daquele homem de quase 2 metros (ou mais), estar morando em sua casa e habitando o quarto cor de rosa de sua irmã caçula, foi um intercâmbio pra Alemanha que sua irmã inventara. Mais uma das maluquices de uma mente verde, de 15 anos.

- E vc vai ter que ficar com ele? Por quanto tempo, mãe? Quero voltar a morar aqui em casa, eu e o Tiago demos um tempo. Também pedi um tempo do trabalho... Ainda tem lugar pra mim, ou algum chinês está morando no meu quarto?

Ouviu um som escandaloso. Olhou pro lado espantada e viu: o alemão estava as gargalhadas. A medida que sorria, ficava mais vermelho. Nunca imaginara uma cena daquela.

- Karl é divertido, filha. Sabe, ele entende português, mas tem dificuldade de pronunciar bem as palavras. As vezes eu entendo, a maioria das vezes, finjo que entendi. Mas, tem sido uma boa companhia.

Karl viera pro Brasil e não tinha 15 anos. Tinha pelo menos un 30. Viera pesquisar algo relacionado a prática da medicina em países subdesenvolvidos. Nao sabia ao certo o que fazia na Alemanha. Médico ou pesquisador, era bem esquisito ter um sujeito daqueles em sua casa. Seria uma experiência estranha, sabia.

Com o tempo, acostumara-se com a presença quase ausente de Karl. Ele passava todo o dia na rua e voltava, aproximadamente, às 20h. Estava elaborando um Portfolio diferente para apresentar em algumas firmas de publicidade, quando ele sentara do seu lado.
Falou algo como "azul", que pedira pra repetir umas 5 vezes. Até que percebeu que ele estava tentando ajudá-la a harmonizar as cores de seu trabalho.
Usou o azul de Karl.
E o trabalho ficou
ótimo.

Toda noite, assistiam um programa de Tv, que passava em um canal pago. Um programa de auditório, idiota, espanhol, de cunho comedioso. Sua mãe se retirava mais cedo e ficavam os dois, lado a lado, assistindo o programa, calados. No começo, se espantava com as gargalhadas do alemão, chegara até a ficar incomodada. Mas agora, já tinha se acostumado ao som e sorria pra ele de volta.

-Olhos bo-ni-tos.
-Rãn?
-Azuis.
-Minhas olhos? Suas que são lindas.

Sorrira pra Karl. Ele achava suas alguma-coisa lindas. Fazia tempo que nao recebia um elogio de alguém.

Uma noite, trocava de roupa. Eram 18h e nao tivera o cuidado de fechar a porta do quarto. O alemão voltava às 20h, pontualmente, todos os dias. Mas, quando abotoava o sutiã pra colocá-lo, sentiu uma presença e olhou pra porta. Os olhos azuis a encaravam. Mas logo saíram de cena. O alemão resolveu ter vergonha do seu voyerismo e se trancou no quarto.

Desse dia em diante, poucas vezes via o alemão. Ele chegava às 20h e se trancava no quarto. Nao jantava com ela e a mãe e nem descia mais, pra assistir o programa de tv.

Pensou em falar com ele, mas resolveu que as palavras complicariam ainda mas tudo aquilo. Sentia falta do som de seu sorriso, é o que sabia.

Pensaria se faria uma visita ao quarto de sua irmã, naquela noite.

terça-feira, 10 de julho de 2007

Medidas desesperadas diante de um jejum sexual.

Letícia tinha duas opões: ou cruzaria as pernas sedutoramente, ou tentaria impressioná-lo com seus conhecimentos culturais.
Acontece que, diante da urgência de suas necessidades - 4 meses de trabalho ininterrupto em que mal tivera tempo de alimentar-se - seu vigente estado de jejum de "homo erectus", apelaria para a primeira opção, mesmo sabendo que passaria tao somente de uma ou duas boas (ou nao) noites de sexo, com o rapaz. Mas, pq nao? Desejava ela mais do que isso?

Cruzou.
Viu seu olhar descer até suas coxas e demorar-se por lá.
Falou do avanço da China.
Nao adiantava mais.
Havia cruzado as pernas.
Nada mais desviaria o pensamento daquele homem.
Seria sexo. Ardente, talvez... torcia, pelo menos.
Mas nao coversariam sobre economia global ou comentariam sobre o novo artigo da "Business".

Agora ela começaria a dar as cartas. Conhecia o jogo.

-Entao vc, nunca vem por aqui?- tocou-o no braço.
Subitamente ele a olha.

Desejo.
- Como disse?

Estava feito. Seria uma bela noite. 4 meses de trabalho initerrupto, uma bela noite, sexo ocasional, nada de romances.

Se o desejo veio na frente, nada de romances, certo?
Era assim que eles pensavam, nao?
Imaginaria ele que, era uma workaholic e uma empresária de sucesso?
Se ela nao tivesse cruzado as pernas, talvez...
Poderia ter citado algum comentário besta, sobre um filme novo, um romance água com açúcar, algum detalhe sobre um artista famoso... isso a colocaria no mundo cor de rosa que ele imaginava que uma mulher deveria estar. Isso o faria rir.

Seu conhecimento de mercado externo, de moeda internacional e de economia mercantil, nao era feminino. O espantaria.

Foi quando resolveu colocar a mão dele em seu colo.

-Nada, nada. Você é tão fofo.

Ele sorriu.
Como ela previra.

Escrevendo com batom

E nao precisa ser em rosa! Passou-se a época em que, ao imaginarmos mulheres, escolheríamos uma determinada cor, fraca e singela.
Nao, nao precisa ser em rosa. Nao há necessidade de definir cor, nem determinar um perfil exato. Vc pode nao fazer parte das descrições que surgem, pode nao se reconhecer nas histórias que aparecem, podem nao querer usar a moda do momento ou cortar o cabelo da maneira "hiper fashion" recomendada. Se tem cachos, nao precisa domá-los. Se nao tem cachos, nao precisa fazê-los. Aliás, precisar é um termo que diz respeito a vc e tao somente a vc, vc mesma. Ao olhar-se no espelho, ao analisar tua vida, ao avaliar teus sentimentos, ao definir teus pensamentos, o que nao mais pode ser decisório no universo disso tudo, ao nao ser o que condiz ctg?
Nao privar-se de vc.
Esse é um lema que deveria entrar em moda, ou ficar em voga, ou sair em alguma revista de sucesso, que algumas mulheres utilizam como modelo de vida e acham que devem copiar.
Mas, talvez, interiorizar seja mais fácil.
É mais fácil, definitivamente...

Eu vi uma sandália branca e quis comprá-la no inverno. Eu amei um homem casado. Eu larguei a profissao de advogada e ingressei no teatro. Eu usei um casaco preto, de couro, no verao. Eu fui de bota pra praia. Eu dexei transparecer meu ciúme. Eu amei o homem que me disseram que nao era o certo. Eu perdoei três traições do meu marido. Eu estou apaixonada pela minha chefe. Eu esqueci o meu filho na escola. Eu namoro um homem 10 anos mais novo. Eu tive um filho com um padre. Eu nao gosto de ir a missa. Eu nao desejo ter manolos, nem pradas, nem gucci. Eu nao copio a moda.
Eu sou meu espelho.
Com as vírgulas, rabiscos, rugas, defeitos, desejos proibidos, ou qualquer outro tipo de coisa que maculem uma imagem que deve ser perfeita.
E assim eu nao me maquio pra mim. Nao mascaro minha face. Nao reprimo meus desejos, nem repudio minhas atitudes. Nao tenho que seguir um padrao. Os meus passos vao, livres.

Eu escrevo com batom,delineador ou lápis. Seja a cor qual for.
E vamos conversar bastante...