quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Sobre os que não dormem

O corpo molhado de suor, febril.
Carregando o verão que chegaria...


Levantou-se da cama, tentando vencer o pouco sono e a vontade de ficar.
As estrelas que sumiam, anunciando um novo sol, o dia que chegava, apagando aquela noite dela...

A vista não era da melhores: pela janela, milhões de apartamentos ponteando seu horizonte sem mar, sem praia, sem uma visão romântica sequer que espelhasse o que sentia.

E o coração ia endurecendo como o concreto da cidade que surgia. O quarto ficando sufocante e o corpo nú envergonhado.

E ele ainda dormia em sua cama.

A insônia foi o que não permitira que o acompanhasse e caísse em sonhos tranqüilos, esquecendo o dia que chegaria. Essa maldição antiga que sempre carregava sua noite de pensamentos inúteis sobre o amanhã, onde pré-vivia o que quase sempre nem chegava.

E ele caído em sonos profundos. Desfalecido. Respiração lenta, de quem não precisa acordar com urgência de viver.
De quem não tem pesadelos, nem medo do sonho seguinte ou agonia de dormir.
Ele que se deleitava em vida e em sonhos, sem qualquer martírio sobre nada. E ela, seu par, carregava tanto medo de dormir, quanto de acordar, provando que mais do que erro, seria um pecado deitar tanto peso na cama leve em que ele dormia.

Pensou nos passos seguintes e no pedido educado para que acordasse, comesse algo da geladeira e saísse em seguida.

Não quis pensar que ele retrucaria. Ou que a puxaria com a força de ontem, sem que ela tivesse qualquer chance de sair. Ela que até lutaria, mas perderia pra sua própria vontade dele.
Assim como antes, o dia de ontem, a noite que desapareceria com o dia. Aquela noite em que todos os "nãos" foram encerrados para que se permitisse ser um par, aos tropeços, dele que merecia os mais belos pés das mais belas danças.
E nunca os dela.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Apagar o que foi dois

É que a tendência era a separação. Segregar partes dele e dela, como se nunca tivessem sido uma. E se é que foram uma, apagar cada lembrança em que não tivessem vivido separados.

Luíza amarrava o coque alto na cabeça, cantando algo simples, deixando a melodia se espalhar pelo ar. Seu canto não era triste e nem sua voz bela, mas havia algo, existia algo nele que gelava os corações de quem ouvisse.

Aquele famoso susto, frio no pé do estômago, tremedeira na base das pernas, algo impressionável, como paixão ou fruta madura. Algo pronto pra ser colocado pra dentro, pra sentir gosto melhor do que qualquer outro e lambuzar os lábios, deixando cair um pouco do açúcar, o doce do que se devora, engolindo todo o resto.

Macaco era seu apelido e ele fingia que não tinha nada a ver com aparência. Imaginava que era flexível e essa flexibilidade o fazia alcançar os galhos mais longíquos e pendurar-se e balançar-se e brincar em cima de árvores enormes e pular pra edifícios e torres.

Sonhava que pulava da ladeira mais alta e dançava no ar. Como o melhor trapezista agarria em algo firme e encerraria sua apresentação com uma manobra final. Alguma que parecesse mágica, que faria com que gritassem o seu nome, imaginando que morreria e no próximo instante gargalhassem de felicidade por encontrá-lo vivo.

Retirou do apelido mais comum o seu personagem circense. E nunca teria a ver com sua aparência, desde que não pensasse assim e continuasse subindo em galhos imaginários, os mais altos, das maiores árvores.

E Macaco e Luíza existiam a parte, porque escolheram assim. Ele não queria um som melancólico acompanhando sua manobra brilhante. Ela não precisava cantar pra algo ou alguém.
Deixavam correr soltos seus corpos e vozes e voavam, cada um a sua maneira, mesmo que um dia tivessem dado seus melhores vôos juntos.

É que tentavam buscar sua própria felicidade cada um, já que não havia sentido em procurá-la juntos.
Não mais.

(É que a tendência era a separação. Segregar partes dele e dela, como se nunca tivessem sido uma. E se é que foram uma, apagar cada lembrança em que não tivessem vivido separados.)

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Mãos

O homem massageia seu pescoço como um Deus!
Vai descendo pelas costas, seguindo um ritmo que ela jamais conhecera.
Aperta mais firme onde deve, deixa solto onde precisa, entendendo perfeitamente os leva-e-traz do seu corpo.
Uma parte mais tensa exigindo uma mão mais forte, enquanto uma outra puxa seus cabelos de leve.
Olha com tanta urgência pros seus olhos que ela sente medo. E mesmo assim, deixa a boca entreaberta, um convite mudo de quem se entrega.
E ela espera que ele a beije, mas acontece que ele a devora.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

O truque das estrelas e do céu

E enquanto o tempo passasse, cada pedra continuaria no mesmo lugar.
...
Até que alguém chegasse e mudasse a ordem das coisas...

Nowhere City.
Janeiro, fim dos tempos.

O mágico da casa 23 está doente e a cidade anda triste.
Parece que não nos acostumamos mais a dormir sem o seu truque das estrelas... Faíscas douradas subindo ao céu e ponteando cada espaço vazio. Faz três dias que dormimos sem estrelas e, pra ser sincera, mal conseguimos dormir.

Existe uma agonia silenciosa. Um medo de deixar de ser príncipe e voltar a ser sapo.
Acontece que cada habitante se acostumou a acordar sabendo que um milagre encerraria o dia. E daí em diante a idéia de um céu sem estrelas, tornou-se inaceitável. De cada cartola esperaria-se um coelho. E sempre seria assim.

Dizem que suas faíscas não passam de truques bem feitos, de quem muito estudou pra dominar a arte de iludir e despertar incertezas e que sobreviveremos sem isso.
E eu só consigo pensar no dia em que ele chegou: eu, menina, soltei da mão de alguém e corri pra receber o viajante. Toquei sua capa longa e esperei ser carregada. Sentia que suas mãos eram mágicas e me fariam sentir melhor. E ele me carregou e me mandou tocar o céu. E eu fechei os olhos e achei tão possível que o senti na ponta dos meus dedos e ao alcance de minhas mãos. Por isso choro pelo mágico e torço pra que ele não carregue sua maleta de sonhos pra longe de mim.
E não me importo que seja truque.

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Era o verde, era.

A árvore cresceu com ela, com a moça.
Cada vez, ela voltava pra fazenda e observava: tinha algo a mais ali e nela.
Algo que faltava nela e não faltava ali.
Alguém com quem até brincou um dia, carregava um filho na barriga e tinha um outro pegando pelos mãos.
A menina casara-se com o vizinho mais próximo e o amara desde então. Os filhos chegavam, todos de sorrisos tímidos, como o dela. Mas sorrisos de quem não carrega culpa, nem peso. Sorrisos leves.
Acordar e viver de um jeito simples. Sem querer a mais ou querer a mais o que não estava tão longe.
E sempre poder correr de pés descalços nos mesmos espaços em que crescera, a menina. Em que alguém, aquela moça, brincara com ela, até que partia. E sempre partia. Partidas que no começo não eram nada mais que curtas. Partidas que cresciam, assim como as árvores e as plantas e o vira lata com quem brincavam.
E o tempo o envelhecia.
Um dia ele morre e a moça nem volta pra jogar um último beijo no montinho onde o enterraram.
E tampouco volta pra saber se o seu cavalo branco, mais companheiro, ainda vivia.
Ou ela, a menina.
Sorriu pra moça, aquele sorriso de antes.
Lembrou que brincavam de escola e ela era a professora.
Aprendeu o alfabeto com ela e achou incrível. Era como uma mágica que algúem carregava e fosse derramar por perto, de tempos em tempos: de mês que passou a ser ano e passou a não ser mais tempo algum.
Apertou forte a mão do filho que ainda não estava na idade de aprender aquelas letras, a mulher.
Chegaria o dia em que contaria pro filho o que aprendeu com a moça. E ele aprenderia a ler.
A moça nunca saberia de tudo isso, porque não voltaria mais, ou porque não esperava que tivesse sido tão importante, enquanto simplesmente brincava.
Só viu que ela sorriu de volta, um sorriso triste, de quem quer além de tudo. A moça olhava em volta, saudosa dos dias em que viveu e não quis muito mais que nada. Admirou a vida que não teria diante de si, aquele sorriso tímido e leve, retratos de uma satisfação que nunca alcançaria na vida. Porque deixou de amar o simples e o simples tinha ido embora: estava enterrado fundo em cada coisa que, sem ao menos dizer adeus, ignorara.
Triste moça.

sábado, 15 de setembro de 2007

E sempre esperando que as histórias fossem melhores e mais intensas.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Marriage

- Lucas, gostei do seu último artigo.
- Finalmente você me elogia. Tinha parado de escutar isso há uns 2 meses.

E quatro dias. Era exatamente o tempo em que estavam morando juntos. A decisão não foi precipitada: namoravam há 7 anos e sempre tiveram certeza de que terminariam juntos. Mas... porque aquela sensação de que tudo estava errado? E porque se irritava quando, abrindo a farmácia do banheiro, achava todas aquelas coisas dela: cremes e potes e sabonetes e pílulas e pílulas e pílulas.
Sofria de "enxaqueca", ela dizia.
O onibus dava enjôo, ela falava.
A pressão subia na tpm, contou.
Sem o anti-alérgico não sobreviveria, dramatizava.

O engraçado é que, em 7 anos, jamais imaginara que sua namorada era hipocondríaca. Ou ela disfarçava bem, ou não conviver com ela, como agora, ajudava a ocultar isso e outras e outras e novas coisas... e mais algumas: ia descobrindo uma nova mania, um gesto, um tique, uma paranóia, todo o tempo.
Sufocava a cada dia.

Ela nunca pensou que moraria com algúem, assim, daquele jeito. Tudo bem, era moderna e acostumada com a nova cena, pelo menos era sobre o que escrevia no mesmo jornal em que ele contava sobre economia.
Se conheceram no trabalho, foi inevitável: bancadas vizinhas em que passavam horas divagando e escrevendo, divagando e escrevendo... Logico que chegara o momento em que se reparariam.
E assim começou. E aqui continua indo.

Tivera sonhos romanticos sim, era mulher, foi menina, brincou de barbie, leu cinderela e acreditou em fadas e príncipes. Nao esperava um cavalo branco, mas aquela situação não era nem de longe o que sonhara: nem tinham anel de compromisso. Não se sentia casada. Dormiam na mesma cama, dividiam a mesma casa e rachavam as despesas. Mas o que seria aquilo, casamento? Nao se sentia mais que uma mistura de empregada e namorada.

Sua enxaqueca aumentara desde que resolveram assumir aquilo. Entupira todas as gavetas da casa de dorflex. E iria no médico exigir um analgésico mais forte. Não tinha paciência pra cozinhar, limpar a casa, atender os telefonemas e transar com o "marido". Toda vez que ele deixava uma camisa fora do lugar, perguntava o que iam comer, o telefone tocava e quando, de noite, ele começava com aquele jeito tão familiar a pedir carinho, parecia que a cabeça dela ia explodir. Vinha disfarçando bem, se entupindo de analgesico, lógico. Na verdade, sabia: precisava de um entorpecente. Mas desde que casaram não usaram drogas "legais" ou ilegais. Precisava ser dopada. Pq ele nao notava?

- Não viaja, foi só um elogio - disse.
- Vou ler sua coluna, agora.
- Faz três horas que você tá lendo jornal e até agora nao viu minha coluna?
- Vou ver agora, Luana.
- Certo.
- Que foi?
- Nada nao.
- E porque essa cara?
- Nada, mas sabe a primeira coisa que eu faço quando abro o jornal? Vou direto pra sessão de economia e leio tudo que tem teu nome embaixo. E olhe que nem me interesso pelo assunto!
- Mas, meu amor, você tá irritada com isso? Você sabe que eu adoro o que você escreve!
- Adora tanto que lê por ultimo...
- Ah, Luana...nao quero discutir.
- Certo, me ignore.
- Meu irmão! Qual é o seu problema? Eu nao fiz nada de errado, po!
- Vc faz TUDO errado, Lucas! Tudo! Você joga as camisas no chao, você nao atende a merda do telefone, você nao me ajuda com a casa, mal me escuta, mal me olha e ainda espera que eu prepare lanchinho enquanto você ler QUALQUER MERDA QUE NAO SEJA MINHA COLUNA!
- Seu problema sou eu, entao? Você quer que eu vá embora?
- Só quero que você me deixe em paz, ok?! Vá embora se quiser, mas me deixe em paz!

Ela começa a chorar. Ele morre de pena. Ficava dividido: obedecer o impulso de sair pra qualquer canto, batendo a porta com força e deixá-la só, ou consolá-la e abraçar e dizer que tudo vai ficar bem e que ia se organizar melhor, a partir de agora.
Ela era linda. Reparara, um dia, que mesmo na cozinha, suada (pq o apartamento era poente e a grana deles curta), cabelo preso, cheiro de temperos, cara de poucos amigos por nao saber cozinhar, ela não conseguia ser qualquer coisa senão linda. E ele só tinha vontade de beijá-la e falar que amava muito.
Mas ela andava tao distante que nem sabia mais o que dizer...

- Luana, desculpa.
- Me deixa.
- Nao precisa chorar, desculpa.
- Você nao entende...
- Nao, mas me ajuda a entender, me conta o que 'tá sentindo...
- Eu nao sei...tá tudo tão difícil...
- A casa, é? Difícil de cuidar? A gente pode contratar alguém... eu chego tarde, saio cedo, nao tenho tempo pra te ajudar com isso. Mas, desculpa, fui egoísta: pensei que só porque seu horario de trabalho era menor que o meu e por voce ser mulher, saberia cuidar melhor dessas coisas...desculpa...
- Nao temos dinheiro pra contratar ninguem...tem aluguel, condomínio, agua, luz, comida, telefone...tah tudo diferente, Lu...
- Amor, eu me esforço. A gente estica a grana. Nao quero mais te ver chorando. Nem quero continuar mantendo nada que afaste a gente, assim...
- Deculpa, amor...ando nervosa...
- Eu sei: culpa minha. Me mate.
- Ahahaha! Mato mesmo, voce merece.
- Amor, deixo tua coluna por ultimo pq sempre deixo as melhores coisas por ultimo, lembra? Quando eu to almoçando, por exemplo, separo a picanha e deixo pra comer depois de tudo.
- Tá chamando minha coluna de picanha?
- Nao, mas a escritora é tao gostosa quanto.

Riram do elogio-piada-chinfrim, se beijaram e transaram no sofá. Depois,ele foi tomar banho, enquanto ela ajeitava a bagunça da sala. Saindo do banho, ele ajustara o despertador do celular e se deitara, esperando que ela tomasse banho e fosse pra cama. Quando ela deitou, ele já sonhava.
Um novo dia, amanha.
Melhor?

Passaram a semana toda procurando empregada. A grana cada vez mais curta, o telefone cortado e ele ainda dormira fora duas noites, dizendo que ganharia um adicional se pegasse horário noturno. Ela imaginava mil coisas e nao se concentrava em nada. Cortara o dedo, fazendo almoço e ele ainda não gostava do que ela cozinhava. O dorflex acabando, as enxaquecas piorando e pra piorar: sua menstruação atrasada há 8 dias.

Mas tudo se resolveria e teminaria bem, no final. Quando ele tomou a decisão mais difícil de ficar em vez de sair e bater a porta é porque sabia que valia a pena.
Acho que isso muda tudo, não?
É o que dizem...
(...mas porque ele não ajudou a arrumar a sala?) =/

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Um romântico?

-As coisas mudaram um pouco, nao é mesmo?

O local era aquele que costumavam ir. A parte mais alta da cidade pequena. Onde um vento certo batia, fazendo cabelos balançarem soltos e roupas colarem aos corpos. O ideal pra quem carrega amor, em vez de paixao. Aquela paz...

- É. Mas nao tem nada a ver com a paisagem...
- Nao. Nós que somos a parte intrusa de tudo isso.
- O que o tempo nao faz? Nós que nos dizíamos parte disso...
- Parece que ele carregou a parte da gente que combinava...
-É...

Aquilo soando sério. O vento, antes, confortável, batia frio, incomodava. Ela queria prender os cabelos, ele segurava a blusa pra que nao voasse muito. Eles que nem se olhavam, mal sorriam, mal falavam, eles que nao perteciam mais àquele lugar...

- O q vc..
-tem feito? - falaram juntos.
-Ahahaha! Isso continua!
-É! Parece que continuamos combinando as palavras em pensamento...
-e falando na mesma hora. Como antes!
- Como antes.
-É...

E as lembranças corriam soltas. Nao falavam...As vezes, deixavam os olhos se perderem na paisagem ou se encontrarem acidentalmente, gerando uns sorrisos desengonçados. Sabiam que estavam compartilhando o tempo deles. O tempo que tiveram juntos.

Alguém que se deitava no colo de outro e nao precisava sentir mais nada. Um dos dois que chegava atrasado e como desculpa, trazia um sorvete que dividiam. Maos que tiravam os cabelos dos olhos, do rosto, para que pudessem se despedir da tarde com um beijo. E a noite que caía e precisavam ir pra casa. E as mãos dadas descendo ladeiras que podiam nao terminar nunca. E a saia dela voando que ele reclamava, brincando de ciúme fingido. E as sandálias dela que ele carregara tantas vezes na mao, quando ela preferia ficar descalça. E quando ela brincava correndo, dizendo que ele nao a alcançaria. E todos os abraços fortes que terminavam sendo o fim da brincadeira. As explosões de paixao, no meio do caminho, atras da igreja. E os olhos marejados por sentirem o que nao entendiam. E cada brincadeira que inventavam pra passar o tempo, esperando que a noite chegasse. Juntos...

(...

- Eu nao queria que você tivesse ido...
- Eu nunca quis que você ficasse.
- Você nunca me pediu pra ir junto...
- Você nao teria ido comigo.
- Nunca imaginei que fosse vê-lo, outra vez.
- Nao era pra ter vindo. Mas eu precisava vê-la.
- Porque você voltou?
- Vou embora daqui há 2 dias. Tinha que te ver.
- Vai me abandonar de novo...
- Deus, você continua tao linda quanto antes!
- Queria que pegasse minha mao e me levasse pra longe.
- Queria beijá-la e que me pedisse pra ficar.

...)

Mas nada disseram. Os olharem contiuavam perdidos e o vento frio, ficava cada vez mais forte. A noite caía, as luzes se acendiam, a paisagem ficava mais bela. Era a hora de se despedir da noite com um beijo. Mas o silêncio continuava e os olhares nao se cruzavam mais. Os corpos elétricos e sufocados, perdendo o momento de se unirem, de conversarem sobre o que tavam sentindo, de fincarem unhas e maos em corpos, de se agarrarem, concordando silenciosamente, que nao queriam sair dali.

- Bem, acho que é hora de dizer adeus.
- Previsível, ran? Cai a noite e vamos embora. Como antes.
- É. Como antes, iremos embora.
- Tão igual e diferente...
- É...
- Foi ótimo te ver, espero que você seja feliz na vida.
- Eu...também foi otimo te ver. Felicidades também.
- Até.
- Adeus... vim a trabalho, vou embora daqui há dois dias.
-Certo, mas eu prefiro até.

E ela começou a descer a ladeira sozinha. E ele ainda ficou uns momentos ali, observando-a. O vento frio, ferindo, cortando, levando a lágrima solitária que caía, pra longe, embora.

Perderam o momento de dizer "eu te amo".
Dizem que quando isso acontece é como se cada estrela do universo entrasse em acordo de que aquele amor nao deveria continuar existindo mais.

É quando a paisagem, entao, muda pra sempre e nenhuma vírgula sequer, consegue voltar a ser como antes.
É quando acaba.
Enfim.
















sexta-feira, 7 de setembro de 2007

E se escrevesse hoje, denunciaria o que vem sentindo.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Intrudução a um novo Drama.

A areia fervia.
A canga fina embaixo de seu corpo deitado, nao ajudavam-na a separar a quentura do corpo do fervor da areia. Uns minutos a mais, insolação nao tardaria. Esperaria...

Olhos fechados, pingos indinstintos pelo corpo, pelo rosto. Um maior chegando à boca com um gosto salgado de lágrima ou suor, mas nao saberia dizer, ao certo, qual deles.

Sabia que queimava. E era como se queimando pudesse também incendiar todo o seu interior. Era como se o gelo por dentro, a frieza de mulher ressentida, evaporasse.
Evaporavam partes dela...

A praia era deserta mas sentiu uma presença. Dizem que quando se está morrendo de insolação, a mente produz imagens de conforto.
E ele estava, agora, na sua frente.
E era um lindo delírio.

Começara um novo drama. Mas...que drama seria aquele? Ja vivera milhares e todos lhe diziam respeito. Que inferno novo começaria com tudo aquilo?
Sentiu raiva e a raiva aliara-se ao sol pra queimá-la.
Partes dela explodiam...

Dez anos...dez anos longe dele, dez anos sabendo que ele tinha sido o responsável pelo fim de seu sonho e o começo do pesadelo, que começava com um casamento sem amor e um alguém que a mantinha presa.
E aquela praia deserta era sua prisão. E os telefones nao funcionavam e estava distante de qualquer estrada. Tanta areia, mar, horizonte, inspirando liberdade, em sua cadeia particular.
Dez anos confinada em uma cela de liberdade.
E ainda amava aquele sorriso odioso.

Fechou os olhos com força.
Quando os abrisse, ele despareceria.
Em seu lugar surgiriam manchas escuras de quem queima o olhar no sol.
Tinha certeza.

- Melina, nao precisa fingir que está feliz em me ver. Mas poderia, por favor, esboçar alguma reação que me viu e cobrir esse corpo tentador?

Ele sorria. Ela nao via, seus olhos continuavam fechados mas ela sabia que ele sorria.
Lágrimas.
Dessa vez, tinha certeza: o gosto era de lágrimas.
Ou seria.