sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Menos

Mais tempo levou tentando fazer uma pequena maleta do que levaria para as três de outrora.
Escolher não era o complicado.
Abdicar era problema.
O que seria e não foi apenas porque assim decidiu.

Tinha aquela mania otimista de achar que tudo caberia

E de acreditar fosse o espaço curto demais para o que desejava
Embora soubesse que poucas coisas realmente importavam,
que momentos não precisam ser muitos para serem mais
E que guardar o que não serve rouba todo o espaço do que deveria estar ali, 
Assombrações sobre possibilidades exigiam-lhe maior tempo para decidir.

Mas foi tentando carregar de menos em suas mãos que libertava aos poucos a sua alma.


quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A menor casa do mundo

Tem uma casa no meio do caminho dos que passam apressados.
Pequena, insegura, prestes a desabar,
Cabem sonhos em 40 centimetros de suas paredes que não caíram porque acreditam se manterem em pé.
Na ausência de assoalho, lágrimas caem de um corpo encolhido, vivo por acaso, maltratado, sem espaço para deitar-se em paz.
Tábuas improvisadas cobrem partes do ser que reza ao não chover, deus de sua necessidade.
No meio de duas ruas, um jardim e essa casa.
Fugindo do relento, percebi, estava um homem?
Rezo que não.

P.

Reticências.

Passava desinteressadamente os canais de TV, não encontrado nada já que nada procurava.
Hipnotizada, deixava-se invadir por delírios, contabilizando suas possibilidades.
Era uma época em que o incerto ocupara um grande espaço em sua vida.
Os planos de outrora, que não cabiam mais ali, sufocaram qualquer nova vontade de novos planos.
Romances e aventuras foram-se sem deixar sequer saudade.
Ofícios que nada diziam sobre si relegados ao passado.
Pessoas que amava ao desencontro de suas mãos...
Deixara-se resumir ao vazio do encontrar-se sem sequer estar.

Reticências invadiam-lhe o pensamento e imploravam-lhe um primeiro impulso.
Que fosse, inclusive, para voltar ao passado mas que fosse.
Certo era que uma nova receita exigia uma nova medida ou um outro ingrediente.
E que nela, sabia:
Era mais de vendar-se e deixar-se ir....
Pensava, com apreensão, que não existiria precisão quanto a garantia de sorrisos
Mas decidira, enfim, que iria buscá-los.

P.



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Ode aos descalços

Se ainda não bastasse o encontro frustrante ainda tinha que quebrar o carro.
E não sendo isso pouco, a chuva apareceu para cumprimentar o restante do dia.
Sim, era uma via movimentada pelo menos.
Mas mulher e só, não arriscou conferir o motor ou outras coisas que não sabia.
Esperou pelo reboque mergulhada em silêncio.

O silêncio é aterrador quando lhe convida para ouvir uma alma que não está em paz.
São tantos convites a pensamentos incômodos, proibidos, sufocados.
Temores, dúvidas, apreensão.
O que era, foi ou deveria ser.

Lembrou-se que tempos atrás o sapato apertara.
E oprimiu-a a tal ponto que deixou de calçar.
Os bons momentos pesaram de menos na balança.
E o sapato, colocado de lado, deu espaço para seus pés descalços.

Doía pensar mas agora parecia-lhe que a dor ainda era maior quando usava aquilo que não mais lhe servia.
E a decisão que fizera algo por ela, certamente, iluminou aquela noite e iria iluminar o resto de seus dias.
E foi sorrindo que esperou consertar o que quebrou.

P.