terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Sobre a morte de Álvares de Azevedo

Era noite e febre. Todo o corpo ardia e os delírios pareciam tão reais que ele estendia a mão para tocá-los. O lápis, o caderno, o futuro livro, do lado, na cabeceira. Um esforço sobrehumano pra alcançá-los e a mão que cai em seguida, ansiando escrever. O suor, a roupa molhada aderindo ao corpo. Os olhos brilhando pra cada uma das moças e cenas de sua alucinação. A boca seca de quem quase nao mais vive. Mas aquela vontade...vontade viva, latente, forte. Vontade de traçar linhas, de dar vida a qualquer coisa que nao existisse. Ou que só existisse em um outro mundo que só ele via. Escrever sobre tantos e todos. Todos os fantasmas que lhe rodeavam e todas as moças lindas que lhe sorriam e evaporavam em seguida.

Era quase profano, quase absurdo que ardesse em febre com apenas 20 anos. Era revoltante, injusto: a mão que caia do lado do corpo em busca de linhas que jamais escreveria. E tantos e lindos e fortes textos que nao pôde dá vida, que nao conseguiu fazer nascer. A mão clamava pelo papel e o esforço que fazia consumia quase toda a chama que ainda ardia no corpo fraco. Um frágil poeta, cabelos pretos, opacos, olhos brilhando pro nada, mão estendida pro papel, corpo desejando o lápis. E era o último esforço, último suspiro, última vontade e desejo daquele corpo quase morto. É quando a mão cai e um ultimo poema que jamais viveu, ia embora com o poeta, que nao escreveu porque morreu.

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