"Desagradável é atravessar a rua, caminhando muito seguramente pela faixa de pedestres e, de repente, 'nao mais que de repente', ser subitamente atropelada por uma motoca..."
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(Eu moro em Olinda, a cidade do carnaval. A época é justamente essa, janeiro. O carnaval, normalmente acontece lá pra fevereiro, por aí.... mas, visto que, toda noite caboclos de lança já passeiam pelas ruas da cidade, chacoalhando sinos, com propósitos que sabe-se-lá-o-que, esse ano começou mais cedo. Já começou.
Peço desculpas pelo meu estilo de escrever, se estranharem. Hoje, meia noite e cinquenta, nao consegui falar sobre outro assunto ou ser mais ou menos superficial do que estou sendo. Vou indo despretensiosamente, certo? Mais do que sempre, aliás.
Já era noite, indo dormir, camisola no corpo, cheia de sonhos bons na cabeça (aqueles que pretendo sonhar e nunca termino sonhando), vontade de amanhã, corpo de hoje... Ouvi o barulho do carnaval chegando e fui na varanda ver de onde ele vinha. A dúvida era se ele passaria por aqui ou se manteria-se distante, se resumindo a ruído e som, por aí.
Agora escrevo. Escrevo porque não apareceu nada na varanda.
Ainda.
Também escrevo porque o sono não chegou, verdade seja dita. Sem sono, minha imaginação pede licença pra se fazer presente e ganhar espaço. Agora, nesse momento, sentarei no sofá ou voltarei a olhar a noite vazia pela varanda. E deixarei que ela ocupe meu lugar e escreva pra vocês. Despretensiosamente, também:)
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"Desagradável é atravessar a rua, caminhando muito seguramente pela faixa de pedestres e, de repente, 'nao mais que de repente', ser subitamente atropelada por uma motoca..."
Sacolas no chão, joelho esfolado. Dois homens me ajudando a levantar do chão. Não deixei de notar, embora a intenção fosse justamente contrária, que um deles piscou pra um terceiro que logo saiu correndo, levando a sacola maior.
O senhorzinho da motoca me dizia coisas que ouvia, de longe. Não me aproximei o suficente dele porque nao queria correr o risco de ataca-lo e arranha-lo e quebrar toda aquela moto maldita dele. Algumas frases como "mas a senhora devia prestar mais atençao" e "esse povo rico que nao sabe andar pela cidade" ou um ou outro "dondoca", chegaram aos meus ouvidos. Confesso que quase pulei no pescoço do motoristazinho. Me segurei. Milhoes de argumentos borbulhavam na minha cabeça. Meu cérebro fervia (mais de raiva do que de argumentos, confesso). Fervia mesmo.
Não explodi. E nao me orgulho nem um pouco disso, é bom deixar claro. Não é nem pela humilhaçao, ou raiva, ou perda de um ou outro material que nem lembro mais do que se trata. Nem pelo joelho esfolado, cotovelo e mão. Não é por nao ter quebrado em pedacinhos a moto do motoqueirozinho. Nem por nada assim.
Sabe pelo que é? É pela injustiça e desrespeito, sabe? O que eu mais sinto, o que mais dói e angustia no meio de tudo isso que passou é essa sensaçao que tenho de desumanidade mesmo. A palavra é forte e o fato é pequeno. Nao sofri danos físicos graves, nao aconteceu nenhuma calamidade, me levantei e aqui estou, contando a historia. É, exagero, talvez. Mas bem, seja o que for, faça o juízo que quiser disso tudo, vou contar o que me incomodou, que é o que, afinal, me fez escrever até agora:
tem danos que nao sao corpóreos. Voce nao pode, simplesmente, estender a mao e alcançá-los. É justamente o meu caso, me sinto assim: Po, pra que existem as leis, se ninguém se preocupa com o outro? Pra que desenhar faixas e codificar alguma legislaçao sobre transito se as pessoas nao olham em frente pra ver se tem outras que podem se machucar se forem adiante? Sempre precisamos de sinais vermelhos e faixas de transito e freios e cintos de segurança. Tudo porque tentamos nos controlar, tentamos conviver, tentamos estabelecer um tempo em que se para uns minutos/segundos, pra deixar o outro passar. Não é assim?
Entao, porque ultrapassar um sinal vermelho, no meio de uma cidade movimentada, onde sabe-se que transita gente, pessoas, humanos, a todo o tempo e hora? Pq nao respirar um segundo e ver que tem gente passando pela faixa branca da frente?
Meu medo é que terminemos atropelados uns pelos outros.
Pois é, a batida foi pequena, meu joelho tá salvo, meu corpo super bem e nao conseguiram roubar minha carteira (embora tenho certeza que tentaram).
A moto, nao vinha em alta velocidade (imagino que, por causa do transito e nao pela boa vontade do condutor) e viva estou. Corpo são e salvo. Mas, minha mente, até hoje, nao para de pensar em tudo isso.
Não se pode tocar a angustia, embora ela se solidifique a todo o tempo, dentro de pessoas, que, como eu, passam por situaçoes parecidas e começam a pensar em tudo isso. Existem até aquelas que nao tiveram tempo de pensar e solidificar nada mais, porque em acidentes como esses, perderam de continuar vivendo e indo em frente...
Me arrependo de nao ter explodido por isso. O motoqueiro deveria ter escutado um discurso bem longo. E nao era um discurso sobre regras de transitos e sobre condutores e pedrestes. Seria um discurso sobre humano e humano. Um que olha pra o outro e concede licença pra que ele passe e possa seguir em frente. Um que enxerga o outro e observa que ele precisa passar. Sem joelhos esfolados, ombros ou maos. Com vida, por favor. E respeito, sempre.
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Esse texto nao foi sobre carnaval. Quem sabe um próximo?
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(Eu moro em Olinda, a cidade do carnaval. A época é justamente essa, janeiro. O carnaval, normalmente acontece lá pra fevereiro, por aí.... mas, visto que, toda noite caboclos de lança já passeiam pelas ruas da cidade, chacoalhando sinos, com propósitos que sabe-se-lá-o-que, esse ano começou mais cedo. Já começou.
Peço desculpas pelo meu estilo de escrever, se estranharem. Hoje, meia noite e cinquenta, nao consegui falar sobre outro assunto ou ser mais ou menos superficial do que estou sendo. Vou indo despretensiosamente, certo? Mais do que sempre, aliás.
Já era noite, indo dormir, camisola no corpo, cheia de sonhos bons na cabeça (aqueles que pretendo sonhar e nunca termino sonhando), vontade de amanhã, corpo de hoje... Ouvi o barulho do carnaval chegando e fui na varanda ver de onde ele vinha. A dúvida era se ele passaria por aqui ou se manteria-se distante, se resumindo a ruído e som, por aí.
Agora escrevo. Escrevo porque não apareceu nada na varanda.
Ainda.
Também escrevo porque o sono não chegou, verdade seja dita. Sem sono, minha imaginação pede licença pra se fazer presente e ganhar espaço. Agora, nesse momento, sentarei no sofá ou voltarei a olhar a noite vazia pela varanda. E deixarei que ela ocupe meu lugar e escreva pra vocês. Despretensiosamente, também:)
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"Desagradável é atravessar a rua, caminhando muito seguramente pela faixa de pedestres e, de repente, 'nao mais que de repente', ser subitamente atropelada por uma motoca..."
Sacolas no chão, joelho esfolado. Dois homens me ajudando a levantar do chão. Não deixei de notar, embora a intenção fosse justamente contrária, que um deles piscou pra um terceiro que logo saiu correndo, levando a sacola maior.
O senhorzinho da motoca me dizia coisas que ouvia, de longe. Não me aproximei o suficente dele porque nao queria correr o risco de ataca-lo e arranha-lo e quebrar toda aquela moto maldita dele. Algumas frases como "mas a senhora devia prestar mais atençao" e "esse povo rico que nao sabe andar pela cidade" ou um ou outro "dondoca", chegaram aos meus ouvidos. Confesso que quase pulei no pescoço do motoristazinho. Me segurei. Milhoes de argumentos borbulhavam na minha cabeça. Meu cérebro fervia (mais de raiva do que de argumentos, confesso). Fervia mesmo.
Não explodi. E nao me orgulho nem um pouco disso, é bom deixar claro. Não é nem pela humilhaçao, ou raiva, ou perda de um ou outro material que nem lembro mais do que se trata. Nem pelo joelho esfolado, cotovelo e mão. Não é por nao ter quebrado em pedacinhos a moto do motoqueirozinho. Nem por nada assim.
Sabe pelo que é? É pela injustiça e desrespeito, sabe? O que eu mais sinto, o que mais dói e angustia no meio de tudo isso que passou é essa sensaçao que tenho de desumanidade mesmo. A palavra é forte e o fato é pequeno. Nao sofri danos físicos graves, nao aconteceu nenhuma calamidade, me levantei e aqui estou, contando a historia. É, exagero, talvez. Mas bem, seja o que for, faça o juízo que quiser disso tudo, vou contar o que me incomodou, que é o que, afinal, me fez escrever até agora:
tem danos que nao sao corpóreos. Voce nao pode, simplesmente, estender a mao e alcançá-los. É justamente o meu caso, me sinto assim: Po, pra que existem as leis, se ninguém se preocupa com o outro? Pra que desenhar faixas e codificar alguma legislaçao sobre transito se as pessoas nao olham em frente pra ver se tem outras que podem se machucar se forem adiante? Sempre precisamos de sinais vermelhos e faixas de transito e freios e cintos de segurança. Tudo porque tentamos nos controlar, tentamos conviver, tentamos estabelecer um tempo em que se para uns minutos/segundos, pra deixar o outro passar. Não é assim?
Entao, porque ultrapassar um sinal vermelho, no meio de uma cidade movimentada, onde sabe-se que transita gente, pessoas, humanos, a todo o tempo e hora? Pq nao respirar um segundo e ver que tem gente passando pela faixa branca da frente?
Meu medo é que terminemos atropelados uns pelos outros.
Pois é, a batida foi pequena, meu joelho tá salvo, meu corpo super bem e nao conseguiram roubar minha carteira (embora tenho certeza que tentaram).
A moto, nao vinha em alta velocidade (imagino que, por causa do transito e nao pela boa vontade do condutor) e viva estou. Corpo são e salvo. Mas, minha mente, até hoje, nao para de pensar em tudo isso.
Não se pode tocar a angustia, embora ela se solidifique a todo o tempo, dentro de pessoas, que, como eu, passam por situaçoes parecidas e começam a pensar em tudo isso. Existem até aquelas que nao tiveram tempo de pensar e solidificar nada mais, porque em acidentes como esses, perderam de continuar vivendo e indo em frente...
Me arrependo de nao ter explodido por isso. O motoqueiro deveria ter escutado um discurso bem longo. E nao era um discurso sobre regras de transitos e sobre condutores e pedrestes. Seria um discurso sobre humano e humano. Um que olha pra o outro e concede licença pra que ele passe e possa seguir em frente. Um que enxerga o outro e observa que ele precisa passar. Sem joelhos esfolados, ombros ou maos. Com vida, por favor. E respeito, sempre.
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Esse texto nao foi sobre carnaval. Quem sabe um próximo?
Um comentário:
contos do cotidiano. meu amor melhor escritora e inovando nos seus contos!
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