Esperou, sem entender muito bem, perto dos irmãos mais velhos.
Eles conversavam baixinho e murmuravam mil coisas, mas seu ouvido e sua pequena cabecinha, registravam apenas palavras como “pai”, “mãe”, “chegaram” e “não”.
O “não” deixava ela triste. Aparecia com muita frequência nos últimos dias.
Os irmãos viviam atentos, de ponta de pés nas janelas, esperançosos, que os pais e a irmã mais velha voltassem pra casa. Ela não. Ela não encontrava brechas entre os irmãos pra esperar e nem alcançar aquela visão deles voltando. Ficava de costas, empurrando seu pequeno carrinho de madeira que nunca corria muito longe pelo corredor, já que não tinha forças para lançá-lo onde queria.
Ali, lembrava bastante da irmã que sempre vinha em seu auxílio, depois de forrar com capricho todas as camas da casa, sua pequena função nos afazeres domésticos que exercia como se fosse grande. Assim como tudo que fazia.
A irmã andava quase dançando. Entrava em um quarto, saía de outro em uma mistura de ballet e alegria particular e única. Em cada entrada e saída, sorria pra ela que também sorria de volta, sem conseguir evitar. Era contagiante.
Chorou um pouquinho lembrando que, quase sempre, no meio dessa dança, a irmã abaixava, chegava pertinho e dizia:
- Não precisa ter forças, pequena. Só precisa querer. Me dá aqui.
E assim pegava o pequeno brinquedo e o fazia viajar pelo corredor inteiro. E naquele momento, como em tantos outros, parecia ser a irmã algum tipo de mágica que com vontade e energia transformava carrinhos de pequenas rodas em foguetes espaciais. Sim Salabim e tudo ficava gigante, maior e melhor.
O seu coraçãozinho apertou, cheio de sentimentos que ainda estava aprendendo a compreender, quando olhou pra aquele espaço, mais escuro e mais frio do que em sua lembrança. Sem ballet, sem dança, sem mágica. Sem ela.
Depois de enxugar as lágrimas de seu rostinho, abraçou o brinquedo com a força e o amor que abraçaria a irmã se ela estivesse por perto e preparou-se pra lançá-lo com determinação, querendo, como nunca, que ele corresse pelo corredor inteiro.
Fechou os olhos quando o empurrou e sentiu dessa vez que ele andou mais um pouquinho apenas para parar mais uma vez e completamente no meio.
Não teve tempo de se frustrar, porque sentiu a agitaçao de seus irmãos na janela e já ia levantando pra ficar com eles, quando levou um susto.
O telhado da casa tremia como se tivesse caindo, os irmãos gritavam como se estivessem machucados e o carrinho, sozinho, se lançou com uma força sobrenatural pelo corredor.
Os pais chegaram sozinhos.
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