quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Tenha calma com tudo, menos com a cerveja no calor de Recife

Tenha calma, embora o verão tenha começado com chuva e trovão.

Tenha calma, há sempre de existir um lugar pra se proteger das tempestades.

Tenha calma com a proximidade das festas. E as ausências que serão choradas e sentidas quando brindarmos a elas.

Tenha calma com o licor, porque em sua doçura encontra-se um torpor inesperado.

E com o vinho não tenha calma. Com a cerveja no calor de Recife também não.

Tenha calma, tenha pausa. Respira pra continuar.

Tenha calma quando ouvires as risadas das crianças. Permite que revigorem energias esquecidas. Motivos pra sorrir tão simples que são assim, infantis.

Tenha calma quando abraçares do mais velho ao mais novo da família. Tenha calma no abraço. Em qualquer abraço. Memoriza, leva, carrega ele. Tatua. 

Tenha calma com a contagem pro final de ano, lembrando que ainda temos tempo pra ser feliz nesse.

Que felicidade se deseja, mas não se programa. Não tenha calma pra ser feliz. Não deixa pra amanhã.

Tenha calma com você, com o "auto-sentimento". Com as cobranças, as percepções rasas, as condições. Seja paciente com os próprios passos. Tenha calma pra percorrer e sentir cada parte do próprio caminho, pra enxergar as pequenas belezas que se escondem nele e permitir-se crescer durante e depois dos obstáculos.

Mas, repito: não tenha calma com a cerveja no calor de Recife. E nem com o vinho em qualquer estado ou tempo. Ou pra se permitir feliz. Nisso não tenha calma.

domingo, 6 de novembro de 2022

Chuva de primavera

Ainda chove na primavera.

Na Bahia, em Canhotinho.

Em Divinópolis, aqui.

Ainda chove na primavera.


Quando chove, guardo o óculos de sol e observo.

As cadeiras dos bares e mesas das calçadas fecham-se por um instante e aguardam.

Aguardam o tempo mudar.


Ainda chove na primavera e eu me recolho às vezes. 

Outras, deixo que os pequenos pingos ou as tempestades passageiras me molhem também.

Combina.

Combina com essa coisa meio termo.

Combina com o meio sorriso desse meio tempo que aguarda as flores que até ontem nem pareciam querer sair.


Ainda chove na primavera e aqui em casa a chuva ajuda a aguar as plantas nos dias em que esquecemos delas.

Um aviso pra não ficarmos totalmente distraídos dessas coisas que parecem apenas complementares, mas que são fundamentais.

Ainda chove na primavera e acabei de enxugar o quintal do jardim.

Pego as cadeiras de praia e distribuo onde o sol aparece tímido, mas aparece.

Ainda chove na primaveira e convido todos a sair de casa. 

Talvez exista um dia inteiro de Sol nessa primeira manhã de chuva. 

Ou mais chuva esperando pra sair.

Ainda chove na primavera e há tanto a esperar dessa inconstância do tempo.

Estações, transformações, ah! 

Ainda chove na primavera.


quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Lusco-fusco

Juana tinha dois tipos de óculos escuros. Os que usava nos dias em que não queria ser reconhecida e os que usava pra chamar atenção.

Aquele era um dia de chamar atenção e o óculos era a única coisa que faltava naquela mulher que Juana via no espelho.

Vestimentas concluídas, se dirige ao estacionamento e aciona o alarme logo no início, como que anunciando sua chegada.

E assim passa o dia, chegando nos lugares como se já esperassem por ela, passando com facilidade pelos caminhos que lhe abriam naturalmente, caminhando com segurança em salto 15, sem desvios, sem tropeços, sem atropelos.

Juana quase foi ao banheiro retocar o batom quando chegou no restaurante, mas resolveu apenas abrir o espelhinho de bolso e ali mesmo pintar nos lábios o carmim.

Reservara uma mesa na varanda pra sentar sozinha, não queria companhia, só atenção a distância, o que interessava não era atrair os outros mas atrair a si e o objetivo maior de tudo já começava a despontar na sua frente…

…o pôr do sol incrível daquele lugar. 

Juana bebericou o champagne e retirou os óculos. 

...

"A beleza não está nem na luz da manhã, nem na sombra da noite, está no crepúsculo, nesse meio tom, nessa ambiguidade" (Lygia Fagundes Telles).


domingo, 7 de agosto de 2022

So What


Duas taças encostadas, manchadas de vermelho no fundo, abandonadas perto da pia e uma garrafa de vinho vazia.


Miles Davis retido no ambiente (“so what”), 

a rebeldia de um jazz mítico de um músico genial, ecos da noite passada.


Paredes frias de um dia frio, manhã que deveria esquentar um pouco e lentamente e suavemente cumpre esse papel: esse de desgelar o tempo.


Estico o corpo.

Coloco a xícara na mesa.

Preparo o café e amo o cheiro inconfundível que invade o ambiente (como descrever cheiro de café? Casa? Café tem cheiro de casa?). 

Preparo algo bom de gostar e aguardo passos descerem a escada.

Sim. 

Ainda sinto frio.

Está aqui, indelével, em cada um dos meus ossos.

Sim. 

Ainda é inverno.

E que seja!

Que seja inverno.

Não importa. 

É tempo de sorrir com as estações. 


domingo, 3 de abril de 2022

Gratidão à Lygia


“Me leia enquanto estou quente”.

Não deixe solitárias minhas linhas incendiárias.

Não abandone o meu texto nos momentos de combustão.

Por favor, permita-me as alterações de alguns sentidos enquanto escrevo.

Aceite o vulcão, aceite a explosão, aceite-me inflamada.

Abranda, afaga, com olhos afetuosos as frases incivilizadas.

Compreende, sim, entende-me insolente, impertinente, deselegante, pouco educada.

Mulher. 

Humana.

Ama também e benevolente cada palavra inconsequente, descontrolada. 

Permite licença ao meu ardor, à minha paixão, à vontade de existir associada à confusão da existência. 


(Ao escrever, sinto as emoções transformando-se em palavras, lanço perguntas, formulo respostas, novos questionamentos, toco minha alma em pontos delicados, me conheço, me desconheço, faço planos, desfaço, sem pretensões, mas esperançosamente, espero tocar sentimentos 

além dos meus, imagino leitores, espero que gostem, embora duvido que entendam). 


Me acompanha, me folheia, até o fim do texto, 

não precisa adorá-lo, nem compreende-lo, nem minimamente gostar do que escrevo,

mas, por favor, “me leia enquanto estou quente”.


(Humilde homenagem a Lygia Fagundes Telles)


terça-feira, 1 de março de 2022

Oceano

Peixes.

Nadando por aí, distraídos, sonhadores, mergulhando na profundeza e na profundidade sem receio.

Peixes me encantam, multicoloridos são o que são: lindos. Pequenos viajantes. Encantantes. Tenho uma predileção especial por peixes. Singelos, sinceros, correndo sempre perigo inconsequentemente, mas indo, sempre em frente. É que sonham demais, percorrem demais. Corações, mentes. Ah, que bom de ver, viver, reviver. Tão, tão, tão doce. Nesse mundo assim, parece injusto, parece deslocado, transcendental. Deixo livre, nadar livre, vai, vai. Sem volta (?). Tão bom de ver chegar, tão lindo e triste de ver partir. Difícil entender, impossível não doer. Mas vai. O mundo é pequeno, um oceano é pouco. Pode ir. Peixes. 


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Nesta data querida

Vou te dá um presente, um bolo saboroso, um abraço apertado e uma cartinha de amor. Talvez um pacote de bombons recheados, uma pizza no sabor que tu gosta, uma receita boa feita por mim e um brinde, acompanhando bebidas que deveriam estar estupidamente geladas ou saborosamente quentes, como devem ser; um brinde (!) , um sorriso que transmite tudo e mais um pouco; um brinde(!), meu amor e todos os sentimentos; um brinde(!) no meio da chuva ou do sol com trovão; um brinde(!), pra te saudar e adorar, amor. Surpresa?

Acho que não.