segunda-feira, 11 de março de 2024

As cores do quadro são vivas e retratam a espada e a balança.
No entorno, flores e cajus preenchem a tela, onde uma mulher cega, no centro, de boca fechada, finge que os instrumentos que carrega na mão, poderiam fazer justiça. 

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

"Onde florescem flores, também floresce esperança" (editar)

Eu não sei falar de Ana Maria tão bem quanto os outros falam, mas Ana Maria entende minhas limitações.

Generosa, certamente vai encontrar nesse texto cada um dos sentimentos. Ainda que não os coloque aqui.

Há algo em seus olhos, na serenidade do olhar, que transmite compreensão. Pura. 

E nessa compreensão que ela transmite, encontro-me perdoado, encontro-me absolvido.

Ana Maria sabe de todos os meus pecados e me conhece como ninguém.

Sabe que até retiro de mim bons momentos, mas que não hesito ao apertar o gatilho. Nem me arrependo dos trabalhos feitos. 

Ela conhece os rastros que espalho em meu caminho e apontaria até a cova mais larga que cavei. Mas Ana Maria nunca fala sobre isso. Nunca traz de volta os fantasmas. Mesmo que reze por cada um quando viro as costas.

Já falei que os olhos de Ana Maria, cada um, foram moldados com compreensão. Pura.

E olhando fundo neles, até acredito existir remissão para mim. 

Ao expiar os meus pecados, ela me permite um novo começo.

E mesmo que eu esteja apodrecido demais para começar bem, é sempre bom enxergar nos olhos de Ana Maria a possibilidade. 

 Mais uma vez me pego iniciando: rascunhos em um espaço branco.

Por necessidade me vejo traçando: histórias que não estavam nos planos. 

Por vezes, acabo insistindo: cedendo às letras um destino.

Na derrocada, termino escrevendo: curando feridas que até desconheço. 

Na teimosia, termino esse texto: alongando as ideias para um novo começo. 

domingo, 18 de fevereiro de 2024

A chegada (do exercício - editar)

Uma suspensão no burburinho do bar, nas notas da música e até do tempo: tudo interrompido por sua chegada.

No meu corpo, os velhos arrepios também denunciavam sua presença. E uma dor pungente, como um soco, no meio do estômago acompanhada de um gosto amargo na boca.

Embora estivesse de costas e assim pretendesse permanecer, senti cada um dos seus passos desbravando cadeiras, mesas e pessoas, até chegar ao meu encontro. Mantive-me firme até quando chamou pelo meu nome, mantive-me estático até quando tocou em mim.

Não anestesiei, entretanto, as emoções que me perturbavam. Não interrompi, todavia, a confusão que se agitava em mim. Certamente não deixei de sentir-me tocado da forma mais profunda quando seus dedos me tocaram da forma mais leve e nem pude deixar de amar e amaldiçoar ao mesmo tempo sua voz entoando o meu nome. 

Mesmo querendo de forma intensa ignorar sua presença e utilizando cada uma das minhas forças para fazê-lo, sabia que nunca havia morado em mim resistência necessária para desatender o amor.

E, assim, contrariado, atendi o chamado. Desvirei-lhe as costas. 


quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

E se os meus sorrisos não tivessem escondido minhas lágrimas?

Mais uma vez ele chega de surpresa.

O interfone toca, não estou preparada, mas me animo, me arrumo, corro ao seu encontro.

Ele havia feito uma promessa de jamais subir no apartamento que eu morava outra vez. E ele era sério com as promessas. Então, encostava o carro numa garagem desocupada de outro alguém e me esperava no hall de entrada. Carregado de sacolas.

Geralmente havia chegado do interior. Ou ganhara ou colhera de suas próprias terras jerimuns, cocos, manga, feijão verde. Também trazia-me revistas que tinha comprado para ele (não me enganava) e achava que eu deveria ler. Superinteressante e outras que misturavam ciência, curiosidade e arte e alguns gibis (eu herdara seus gostos). Mal sabia ele que parte do dinheiro do estágio que eu ganhava, gastava assinando aquelas mesmas revistas, mas eu nunca o contava. Nunca queria estragar o momento.

Dessa vez, ele me fez outras promessas. Eram grandes promessas. De viagens pro Oriente, pra Terra Santa (ele era religioso, graduou-se em teologia). Eu sorria e acreditava. Acho que em algum ponto eu acreditava de verdade, mas sempre me perguntei que se minha imaturidade não tivesse atrapalhado, teríamos tido outra conversa:

Pai, eu não gosto de jerimuns. E nem de feijão verde. Eu já assinei essas revistas com o pouco dinheiro do estágio que eu ganho porque não posso esperar que uma vez ao ano você as traga para mim. Eu também não quero ir pra Terra Santa. Não sou religiosa, nem rezo mais. Eu queria voltar a ir pro Parque Dois Irmãos contigo. Eu queria ir pro cinema ou dá uma volta de carro. Que tal ficarmos só aqui conversando? Ou irmos comer uma pizza perto? Por que você volta tão rápido se demora tanto pra vim? Por que você demora? 

Seria um diálogo longo e provavelmente incomodativo. Talvez ficaríamos tristes, talvez discutiríamos. Então eu aceitava. Aceitava o amor que ele me dava naqueles momentos, mesmo sabendo que não era suficiente. Até que eu resolvi deixar de amá-lo de volta para não sofrer mais. 

Até que eu parei de esperar.

Até que ele parou de vim.

Até o fim ter colocado um ponto final nisso tudo.

E me fazer continuar questionando se não poderíamos ter tido mais. 

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Errante

Me parece que as coisas estão realmente acontecendo. 

Não vou dizer que em algum ponto esperei por isso, mas desejei, claro, desejei.

De qualquer forma, o copo - pela metade - ainda se revela mais vazio do que cheio para mim. 

Não é um conceito que aplico a todos - aliás, para todos vejo o corpo transbordando, superando, superado.

Para mim, entretanto, permaneço insistindo na tentativa constante de enxergá-lo positivamente. No que falho. Falho continuamente.

Tenho buscado algumas explicações para isso. Personagens, histórias, biologia, química, patologias, complicações mentais, traumas. 

Nessa busca, encontro, desencontro, aceito, rejeito, mas nunca desisto.

Parece-me, por vezes, que o que está fora do lugar são as prisões nos conceitos pré-definidos que me fazem decretar-me errada, errante. 

E talvez errante seja tudo o que eu possa ser. 

Basta não enxergar problema nisso. Basta nao permitir que me façam enxergar como um problema. 

"A coisa nenhuma deveria ser dado um nome, pois há perigo de que esse nome a transforme" (Virginia Woolf)


sábado, 27 de janeiro de 2024

Um textinho simples para a minha dançarina

 Minha pequena bailarina, sola, enquanto cresce.

Com coragem dança a música preferida, rodopia, gira, quase vira estrelinha. 

No acompanhar de seus passos, meus olhos brilham e meu coração - cer-ta-men-te - cresce.

No universo de coisas tão difíceis de entender, me permito compreender tão somente as fáceis: amor, orgulho, cuidado, torcida.

Minha bailarina aviva, esquenta, me faz enxergar razões pra existência, pras caminhadas, pras batalhas, pras lutas diárias com o mundo e comigo mesma.

Ela é o mundo, ela é tudo, a razão que me faz atravessar os cruzamentos e qualquer encruzilhada. 

O destino, o motivo, a pulsão até a chegada.

O alicerce, o fundamento, o sustentáculo, a alma.

 A chama acesa em toda a caminhada.