segunda-feira, 13 de junho de 2022

O que assusta mais que fantasmas


Eram quase cinco horas da tarde, havia chegado cedo do trabalho e corri pra brincar com meu filho Gael no quarto. Espalhamos, dividimos e compartilhamos muita coisa - especialmente risadas e momentos pra guardar e lembrar e, apesar do meu habitual cansaço, torci que o tempo passasse devagar e que aquele instante durasse pra sempre.

Estar cansada é o meu normal. Parto, puerpério, amamentação, rede de apoio distante, pandemia, educação, trabalho, família, casa, vida social. No meio disso tudo, me encontrar e ter energia é bem difícil às vezes, embora naquele dia não. Naquele dia, eu armei a discoteca e espalhei com ele uns doze brinquedos pelo quarto, sem pensar na trabalheira que seria colocar tudo no lugar e convencê-lo a parar, tomar banho, jantar e dormir depois. Ou me engano ou foi o café. Me sentia energizada.

Embora ele tenha tanta imaginação que eu mal alcanço, não esperava a revelação que me deixaria atônita e sem saber o que fazer. Ainda acho que foi um sonho, ainda acho que ele só repetiu algo que gravou de algum desenho ou livro, muito provavelmente ele estava inventando, mas seus pequenos olhos estavam tão sérios e tristes, que me peguei acreditando. 

Segundo Gael, havia outra criança no quarto. Um menino, de chapéu azul, que havia perdido os pais e estava triste por isso. "Ele não sabe onde tá a mamãe e o papai dele". Pedi que apontasse o lugar em que a criança estava, mas meu filho continuou apenas repetindo a história e fazendo sinal de "não sei". 

Antes de pensar em espíritos e me aterrorizar com a situação, outra coisa me ocorreu. Um temor maior, ao mesmo tempo amor, reza e torcida. Que me fosse permitido muitos anos e muitas ocasiões em que pudesse simplesmente estar presente junto do meu filho. Mesmo sem energia, mesmo me sentido aquém, mesmo nos dias em que me falta "café". Olhar dentro do seus olhos, transmitir mil milhões de sentimentos bons, aquecê-lo e fazê-lo entender que sempre, de alguma forma, da que puder e conseguir, estarei ali. 

E que em nossos momentos, acompanhados ou não de coisas que poderiam assombrar, deixemos os minutos durarem pra sempre, porque o que importam ponteiros de relógios que apontam e ditam coisas diferentes se decidirmos que não deverá ser assim?

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